A LEI DO DESARMAMENTO

Quem serão as vítimas?

DESARMAMENTO

Imobilização dos homens honestos,favorecimento dos criminosos

Se for aprovado o Projeto de lei enviado pelo Governo Federal ao Congresso Nacional, serão vulnerados Mandamentos do Decálogo e princípios da própria Lei natural

Cel. Carlos Antonio E. Hofmeister Poli (R1)*

Desde que a opinião pública nacional tomou conhecimento do Projeto de lei 1073/99 que proíbe, entre outras coisas, a posse de armas de fogo por homens honestos, o assunto passou a ter destaque especial nas conversas dos mais diferentes grupos sociais. Isso porque não falta inteligência nem bom senso ao brasileiro para avaliar a importância da medida e assumir contra ela uma posição categórica e até indignada.

Com efeito a opinião pública brasileira, globalmente considerada, é católica. Os desmandos do progressismo – se afastou multidões das igrejas – não conseguiram fazer com que nosso bom povo deixasse de raciocinar em função dos princípios morais ensinados pela única Igreja verdadeira, para distinguir o bem, o verdadeiro, o legítimo e o conveniente do que é mau, falso, ilegítimo e pernicioso.

Assim, a vivacidade com que o assunto foi tomado pela opinião pública se explica, porque o brasileiro intui que o mesmo encerra uma importante questão de ordem moral.

Por isso, antes de tratar dos relevantes e também decisivos aspectos materiais que o assunto contém, abordaremos sua implicação no campo moral.

E adiantamos a tese: o desarmamento de homens honestos implica numa questão moral, razão pela qual – em consciência – não pode ser aceito.

Essa tese, que a opinião pública nacional intui, lucra em ser explicitada e demonstrada.

É o que pretendemos fazer neste artigo.

 

O Decálogo compendia toda a lei moral e é o fundamento da ordem social

Deus, em sua infinita misericórdia, considerando a situação do gênero humano decaído pelo pecado original, revelou a Moisés os Dez Mandamentos – o Decálogo – para que o homem, individualmente, tivesse condições de praticar a virtude; e a família, a sociedade e o Estado pudessem atingir os fins para os quais existem: a perpetuação da espécie e a educação da prole, de um lado; e de outro, a promoção estável do bem comum da sociedade civil.

Isso porque o Decálogo encerra toda a lei moral e é o fundamento da ordem social. Daí, tudo o que está de acordo com a Lei de Deus é bom, produz o bem e deve ser obedecido; e o que a contraria é mau, gerador de desordens e deve ser recusado.

 O V, VII e X Mandamentos impõem a legítima defesa

Assim como o VII e X Mandamentos – "Não roubar" e "Não cobiçar as coisas alheias", – defendem a propriedade privada e os cuidados que o indivíduo e o Estado devem tomar para preservá-la; o V Mandamento, "Não matar", define outro tanto em relação à vida humana.

Obrigação grave que pesa sobre todo homem e sobre o Estado: cada qual deve proteger, primeiramente, sua vida e depois a de seus próximos, tanto mais quanto outrem lhe for próximo: pais, irmãos, parentes, empregados, amigos, conterrâneos etc.; e o Estado deve propiciar condições para que essa defesa possa se efetivar. Porém, o primeiro responsável pela vida, perante a ordem moral – portanto, perante Deus – é o próprio indivíduo.

Essa obrigação, decorrente do V Mandamento, o homem a cumpre alimentando-se convenientemente, obtendo pois os recursos materiais para isso com o suor de seu rosto se necessário for; protegendo-se das doenças e tratando-se quando atingido por elas; defendendo-se dos criminosos, providenciando portanto os meios eficientes para a legítima defesa – sua e de seus próximos – e tomando as medidas preventivas para a proteção pessoal, familiar e de seu patrimônio.

 Família, propriedade e legítima defesa

Quem se detiver na análise cuidadosa da Lei de Deus, verá surgir dela maravilhas de coerência que interpenetram e harmonizam realidades que, à primeira vista, poderiam parecer conflitantes.

Assim, os V, VI, VII, IX e X Mandamentos, definindo direitos e obrigações referentes à vida, à estrutura familiar e à propriedade privada, estruturam a legitimidade de toda a ordem social e a harmonizam com os interesses individuais.

Com efeito – data vênia insistimos em aspectos já referidos aqui – os VI e IX Mandamentos ("Não pecar contra a castidade" e "Não desejar a mulher do próximo") defendem a instituição da família; já o VII e X ("Não roubar" e "Não cobiçar as coisas alheias") defendem a propriedade privada; e o V Mandamento ("Não matar") regula as obrigações perante a vida: procura evitar a morte, a doença e assegurar as condições de sobrevivência e de segurança.

Por essas rápidas considerações constata-se facilmente que os conceitos de vida, de família e propriedade são correlatos entre si. Pois a propriedade é condição da viabilidade da instituição familiar e de sustentação da vida; esta, por sua vez, tem como meio normal próprio de ser gerada e de pleno desenvolvimento, a família.

 A legítima defesa começa no âmbito individual e familiar

Retomando o assunto, a missão do Estado perante a vida consiste em criar condições para que os homens individualmente, em família e nos diversos segmentos sociais possam sustentar-se, progredir, tratar-se quando doentes e proteger-se.

A função de proteção – assunto em pauta –, o Estado a exerce garantindo a soberania nacional e a ordem governamental, perseguindo e punindo o crime, promovendo a segurança pública preventiva e ensejando que os homens honestos disponham de meios eficazes para sua defesa, de suas famílias e de seu patrimônio.

Porém é necessário notar que a intervenção indiscriminada do Poder Público em matéria de segurança – como também em todos os setores da vida nacional – deve levar em conta o princípio de subsidiariedade, tão bem explanado na Encíclica Mater et Magistra, de João XXIII. Ou seja, no âmbito individual e familiar, como também empresarial, o Estado não deve interferir sem razões graves e comprovadas, porque é próprio ao indivíduo, à família e à empresa poderem fazer tudo aquilo de que, por sua natureza, são capazes, e serem apoiados pelo Estado apenas subsidiariamente no que ultrapasse seu âmbito.

Ora, a natureza das coisas assim o exige e a recente experiência dos países socialistas e comunistas o demonstra: nada mais eficiente do que o indivíduo, a família e a empresa para realizar o que lhes é próprio, e nada mais desastroso do que o Estado se meter a fazer o que é do interesse privado.

Tal ocorre também – e talvez, sobretudo – com os problemas de segurança, individual e familiar. Estes englobam providências que vão desde o fechamento da casa à noite, até o enfrentamento com o ladrão que força o portão para roubar galinha... ou seqüestrar o filho de um próspero industrial, ou ainda violentar pessoas queridas etc.

 O "dever-de-estado" conta com graças divinas especiais

A doutrina católica ensina que o homem, no desempenho das obrigações decorrentes da condição em que vive, conta com graças especiais. É a mão paternal da Providência Divina apoiando o operar de tudo o que é legítimo.

Essas obrigações chamam-se "deveres-de-estado", e as graças correlatas, "graças-de-estado".

Assim, o médico que assiste ao enfermo conta com uma proteção especial da Providência Divina para não ser arrastado nas tentações que o corpo humano causa; o militar e o policial, para enfrentar um risco iminente, dispõem de uma graça que lhes fortifica a coragem etc. Além disso, todos, médicos, militares e policiais – tomados como exemplo – terão uma ajuda adequada para o êxito do que, por dever-de-estado, devem fazer.

É próprio aos pais uma "graça-de-estado" para cumprirem, como ninguém, suas obrigações na família. Como as mães têm um dom – ou seja "graça-de-estado"– para educar, corrigir, apoiar, sobretudo para consolar os filhos, o chefe de família é especialmente favorecido pela Providência para defender o lar.

Por outro lado, essa obrigação – note-se, não é apenas um direito – de defender o lar, é inalienável e não há poder na Terra que legitimamente possa substituí-la, pois decorre da própria natureza da família assim como foi ela instituída por Deus.

É o chefe de família quem melhor sabe das providências a tomar e dos meios de que deve dispor para a defesa. Pois, além do legítimo interesse que o move, ele conta com "graças-de-estado" próprias à sua condição.