A LEI DO DESARMAMENTO
(continuação)

Missão subsidiária do Estado na defesa individual e familiar

O exercício da defesa individual e da defesa familiar assim concebidas, isto é, decorrentes de uma obrigação de estado e contando com graças especiais, é um bem em si e necessário à boa ordem das coisas. E, ademais, assim é visto pelo público em geral, embora em termos não doutrinários, mas práticos. Por outro lado, o Governo deve ver nisso um meio apto de atingir o bem comum, num âmbito que ele não tem condições de promovê-lo, a não ser subsidiariamente.

Essa ação subsidiária do Estado – indispensável mas subsidiária, é bom insistir – inclui uma regulamentação para o uso dos meios. Como ainda programas educacionais sobre o emprego adequado deles.

Como se vê, regulamentação e campanhas educacionais não para impedir o uso desses meios, mas adequá-los ao que se destinam, para dar-lhes mais eficácia no emprego, com um mínimo de risco.

Ainda assim, o Estado deve ter em vista que o geral dos campos de atuação do homem, mesmo os mais legítimos, comporta riscos como, no caso, o emprego de armas de fogo. Esses riscos devem ser calculados, mas seria utópico e malfazejo pretender extingui-los totalmente. Extinguir riscos, em muitos casos, pode ser extinguir atividades vitais, sem as quais a vida ficaria inviável. Não é necessário exemplificar, tão evidente é a realidade.

 img15.jpg (12253 bytes)É contrário à ordem natural proibir aos bons o exercício de uma função que lhes é própria

É próprio a uma ordem social sadia incrementar o bem e dar-lhe toda a liberdade de ação; simetricamente cercear, quanto possível, o mal e a liberdade de praticá-lo. Esse é princípio básico da Civilização Cristã.

Por outro lado, o que caracteriza aquilo que se opõe à ordem natural é tolher ao bem a liberdade em toda a medida do possível e proteger, favorecer e prestigiar a liberdade para o mal.

Nesse contexto, como qualificar o fato de o exercício da legítima defesa de homens honestos ser impedida pelo desarmamento geral? Não é isso limitar a liberdade dos bons? Não é favorecer a liberdade para o mal?

Sim, porque quem está disposto ao crime não vai renunciar aos meios de que dispõe para cometê-lo pelo receio de uma sanção legal menor do que a acarretada pelo próprio crime. É isso evidente, pois quem aceita o risco de ser condenado por um assassinato não vai se coibir do uso de armas pela eventual pena de seu uso ilegal.

Por outro lado, o homem honesto que pauta a vida pela legalidade ficará desarmado! Uma vez que a vítima potencial esteja desarmada, o que impedirá o bandido de cometer o crime? Não é isto – indireta, mas eficazmente – promover e prestigiar o mal? No sentido próprio e estrito da palavra é subverter, ou seja, colocar em cima o que deveria estar embaixo: é o Estado agir contra o bem comum, contrariamente, portanto, à sua razão de ser. 

Grave omissão do Estado: a propaganda do crime

As considerações anteriores vão naturalmente se encaminhando do terreno moral – portanto doutrinário – para o concreto.

Não se conhece pessoa de bem, atualmente, que não se sinta envergonhada, humilhada e apreensiva com o que vê em certos programas de televisão.

"Certos programas", dissemos, mas tão entranhados estão eles no contexto geral despejado pela televisão, que a palavra "certos" fica, no caso, de um alcance muito questionável.

Nesses "certos programas" o que se vê, o que jovens, adolescentes e até crianças têm diante de si? Pornografia e violência.

Mas pornografia e violência apresentadas com sedução, ou seja, propaganda da imoralidade e do crime. Portanto, a propagação da perversão moral e da subversão naquele sentido estrito.

Qual a atuação do Estado contra tal propaganda do crime? Estudos, numerosos e irrefutáveis, mostram como a pornografia é favorecedora ativa dele.

É uma irrisão – nesse contexto em que assim se faz tal propaganda do crime – falar em desarmamento geral para coibi-lo. 

Grave intromissão do Estado: monopólio da coragem

É fácil ver como o lema Tradição, Família e Propriedade reúne conceitos correlatos uns com os outros e resume a ordem social enquanto concebida nos planos de Deus.

Simetricamente, socialismo, totalitarismo e utopia constituem uma trilogia de termos também reversíveis entre si.

No célebre livro Revolução e Contra-Revolução, Plinio Corrêa de Oliveira mostra essa reversibilidade, bem como a fonte dos direitos individuais que é o próprio Deus, autor da natureza humana.

Para o socialismo, o fundamento desses direitos não é Deus, mas o Estado legislador, o qual se incumbe, por sua vez, de velar por todos os interesses particulares. Como se vê, nessa concepção, além do elemento subversivo, existe uma utopia.

No caso da segurança pessoal, segundo a concepção socialista, a lei regulará e o Estado proverá: se for bem feita – suposição para quem está no mundo da lua – ou mal feita, são contingências secundárias. Ao indivíduo e à sua família cabe resignar-se ao que lhes for oferecido.

Estado socialista monopolizador da coragem! Como admitir tão bela virtude em tão má companhia!

Necessidade de proibir o uso de armas de fogo não está demonstrada

Como bem explica Plinio Corrêa de Oliveira na obra Reforma Agrária, Questão de Consciência (*), pode haver circunstâncias anômalas em que o bem social exija a limitação provisória de direitos individuais, pois aquele prevalece sobre estes. Salus populi suprema lex esto (Que a salvação do povo seja a lei suprema), dizia o Direito Público romano.

Para que isso ocorra, contudo, é necessário estar amplamente demonstrado que a anomalia social só se resolverá com a limitação de direitos individuais.

No caso do Projeto de lei 1073/99, quem for procurar alguma demonstração na Exposição de Motivos do Ministério da Justiça, que o encaminhou ao Congresso Nacional, ficará inteiramente frustrado.

Com efeito, só se entende a argumentação constante da referida Exposição de Motivos partindo-se do princípio de que, desarmando a vítima, o criminoso não atuará. Ou seja, abrindo-se as jaulas, as feras não atacarão!

Outro entendimento não se pode ter lendo-se, por exemplo, o ítem 9 do documento citado: "Para impedir que a violência continue grassando, não é suficiente apenas proibir a venda de armas de fogo. Necessário é que haja um posicionamento legal sobre as armas que estão em poder de particulares.... no sentido de determinar aos proprietários das armas que as recolham às unidades das Forças Armadas....".

Por outro lado, o Sr. Ministro da Justiça reconhece, no próprio documento em pauta, que a aplicação da lei anterior sobre o controle das armas de fogo não teve por conseqüência a diminuição de crimes. Eis suas próprias palavras: "Pretendia-se com este diploma legal (lei 9437, de 20 de fevereiro de 1997) obter-se um efetivo controle de armas de fogo no Brasil e, como conseqüência, sensível diminuição das estatísticas de crimes. Infelizmente, tais expectativas viram-se frustradas...."

Além de não demonstrar a necessidade de desarmar homens honestos para diminuir a criminalidade, um só exemplo parece suficiente para caracterizar como é vaga e inconclusiva a argumentação constante da mesma Exposição de Motivos, extraída de seu item 6: ".... episódios envolvendo o uso inadequado de armas de fogo, ocorridos na década de 90, têm compelido países que, historicamente, sempre reconheceram direitos aos cidadãos de possuírem armas de fogo para defesa pessoal, como os Estados Unidos, por exemplo, a debaterem o assunto e reverem suas concepções sobre a matéria".

Como pretender que "rever e debater" equivale a demonstrar? Como também, nada mais vago e impreciso do que considerar uma medida debatida nos Estados Unidos, sem sequer mencionar o teor e a conclusão do debate, como aplicáveis ao Brasil.

 

Projeto de lei mal elaborado

Sendo um diploma legal a ser eventualmente inserido na ordem jurídica do País, é normal se ouça o parecer de Juízes de Direito, sob seu aspecto técnico-jurídico.

Com efeito, em documento enviado aos Srs. Deputados, os Juízes de Direito, Dr. Fernando Figueiredo Bartoletti e Dr. Carlos Vieira von Adamek concluem a análise do Projeto 1073/99 propondo modificações necessárias ao texto original, "em razão da falta de técnica legislativa na sua elaboração.

"Os equívocos demonstram que seus elaboradores não possuem maior conhecimento jurídico da matéria.

"Apresentaram ao parlamento texto apressado e sem uma maior reflexão sobre suas conseqüências jurídicas, inclusive sobre o erário público, a quem caberá custear os processos e as indenizações a que a norma der causa.

"Aproveitaram-se de momento de comoção social em decorrência das escaladas dos índices de violência e de criminalidade no País, simplesmente para criar nova cortina de fumaça sobre o tema, sem qualquer conseqüência de relevo e expressão na matéria".

Como conclusão, os dois Magistrados afirmam que, feitas as correções indispensáveis no texto do Projeto, "vê-se sua desnecessidade, já que toda matéria encontra-se disciplinada quer por leis complementares e por leis ordinárias". 

A lição de Sum Tzu

Considerando o panorama nacional, vemos que, cada vez mais, elementos de violência vão se corporificando em estruturas perigosas que ameaçam nossa própria estabilidade social. Basta ter em vista o noticiário sobre as operações realizadas por comandos de seqüestros, de assaltos a bancos etc. Alguns até já têm nome, como "Comando Vermelho"...

Dentre esses elementos de violência, cabe destacar o MST, considerado por vários jornais de peso como embrião de forças de guerrilha, ou mesmo como uma guerrilha já praticamente implantada no País.

Como toda guerrilha em sua fase inicial, esses elementos contam, para progredir, tanto ou mais com conivências de caráter político, do que com as próprias operações que desenvolvem.

Nesse contexto, não se pode deixar de aplicar à realidade nacional os ensinamentos de Sum Tzu, grande estrategista chinês de há 25 séculos.

Aliás, os estudos de estratégia contemporâneos dão realce crescente a Sum Tzu, pois ele aborda a problemática militar levando muito em conta, como elemento de guerra mais eficiente que as armas convencionais, os fatores da conquista psicológica.

Diz Sum Tzu: "Lutar e vencer todas as batalhas não é a glória suprema. A glória suprema consiste em quebrar a resistência do inimigo sem lutar".

Ora, um modo por excelência de quebrar a resistência sem lutar é desarmar o inimigo.

Num passado bem recente, no fim dos anos 60 e na década de 70, tivemos grupos organizados de guerrilha e de terrorismo urbano, que então atuaram, como hoje o faz o MST, para subverter a ordem social no Brasil.

É, pois, motivo de grande perplexidade o fato de terroristas e guerrilheiros daquele tempo, hoje anistiados, ocupando cargos políticos de relevo, serem propugnadores do desarmamento geral.  

Conclusão

O Projeto de lei visando o desarmamento geral da população brasileira constitui:

  • grave risco de entregar nossa Pátria nas mãos de elementos subversivos;

  • sacrifício ou eliminação de um direito dos mais fundamentais, que é o direito de legítima defesa pessoal, familiar e do patrimônio;

  • enorme questão de consciência, porque esse direito consiste também numa grave obrigação intransferível imposta pela Lei de Deus.

Portanto, os brasileiros e de modo particular os católicos devem ver nesse Projeto de lei uma injustiça contra a qual devem se opor com todos os meios lícitos.

Somos herdeiros daqueles que não se resignaram a entregar nossa terra aos huguenotes franceses no século XVI, nem aos hereges calvinistas holandeses, no século XVII. A Insurreição Pernambucana ocupa papel decisivo na formação de nossa Pátria. Nessa Insurreição, o Exército nacional, ao qual me honro pertencer, teve seu berço.

Na Terra de Santa Cruz, quando se configura um problema de consciência, o brasileiro torna-se circunspecto: olha em torno, analisa e espera a oportunidade de agir. E atuando, sublima-se, podendo reparar tudo quanto de erradamente concessivo lhe deve ser imputado.

Nossa Senhora é Rainha do Brasil. Em Aparecida, desfila diante dEla, de modo contínuo todo nosso povo, mesmo o mais miúdo, a Ela vinculado mediante um liame materno e filial. NEla todos confiamos, porque, apesar de tudo, nós somos filhos e Ela é Mãe: filhos muito censuráveis, a vários títulos, e por isso contritos. Em todo caso, filhos.

Nossa Mãe, nossa Rainha, Nossa Senhora indicar-nos-á o que fazer, a oportunidade de agir e conceder-nos-á as graças para obtermos a manutenção dos direitos de ordem natural e a paz que almejamos.

 

* O Autor é Coronel do Exército de Cavalaria e Estado-Maior e também Diretor da TFP.

 

** Reforma Agrária – Questão de consciência – Editora Vera Cruz Ltda., São Paulo, 1961 – 3a. edição, p. 196 e ss.

 

Vaticano

"Existe o direito à legítima defesa por meio das armas"

Até mesmo a Constituição Pastoral Gaudium et Spes afirma categoricamente:

"Em um mundo marcado pelo mal e pelo pecado, existe o direito à legítima defesa por meio das armas (Constituição Pastoral Gaudium et Spes, 79). Esse direito pode tornar-se um dever grave para quem é responsável pela vida dos outros, pelo bem comum da família ou da comunidade civil (Catecismo da Igreja Católica, nº 2265)".

(O Comércio Internacional de Armas – Uma reflexão ética, 1º/5/1994, assinam o Cardeal Roger Etchegaray, Presidente do Pontifício Conselho Justiça e Paz, e Mons. Martin Diarmud, secretário. Vozes, Petrópolis, 1994, pág. 17)

 

O absurdo projeto de "Lei do desarmamento"

Cel. Mario Hecksher Neto (R1)*

Algumas "cabeças pensantes" do atual governo têm a pretensão de querer impor aos cidadãos de bem procedimentos e opções em matéria de segurança pessoal.

Isto ocorre em um País que se diz uma democracia representativa e numa situação em que o governo federal e os governos estaduais não vêm demonstrando a mínima competência para controlar os bandos criminosos que, de modo alarmante, seqüestram e matam pessoas, praticam contrabandos de todos os tipos, inclusive o de armas, traficam drogas impunemente nas ruas e nas escolas, exploram a prostituição de adultos e crianças, dominam presídios de segurança máxima e infiltram-se nas Polícias, nas Forças Armadas, no Poder Judiciário e no Congresso Nacional.

Eis que, diante desse caos, o governo resolve enviar ao Congresso o Projeto de lei 1073/99 simplista e amparado em argumentação inconsistente que, na prática, sancionará apenas aqueles que estão agindo de acordo com a legislação em vigor, isto é, os cidadãos que têm suas armas registradas, portes de armas concedidos pela autoridade competente e os colecionadores conhecidos e autorizados.

As motivações que levam o cidadão a possuir uma arma são variadas e desde épocas imemoriais o homem se armou para defender sua família e os seus bens nas situações de perigo, como está acontecendo agora, diante da incompetência do Estado brasileiro que não nos protege.

Mas não são essas pessoas que cometem crimes. Elas normalmente reagirão, em legítima defesa, às agressões.

Não cabe também aos burocratas de plantão deduzir que tais pessoas não têm competência para usar uma arma em defesa própria, num confronto com marginais. Essa afirmação é baseada em dados estatísticos incompletos e não confiáveis, produzidos certamente para justificar a posição dos propugnadores da medida. Ter ou não uma ou mais armas, dentro dos preceitos legais, é uma opção pessoal do cidadão que deve ser respeitada!

Essa lei de desarmamento geral, se promulgada, não diminuirá o contrabando, o tráfico de drogas, os seqüestros e a violência; ao contrário, deverá estimular esses delitos. Os bandidos, de agora em diante, terão certeza de que as pessoas de bem não poderão reagir, pois tiveram seus revólveres e pistolas, geralmente de fabricação nacional, apreendidos pelo governo, enquanto eles continuarão com seus potentes fuzis e metralhadoras, vindos da América do Norte e da Europa, bem lubrificados e prontos para nos ameaçar, roubar e eliminar.

Lamentavelmente, a mídia, quase toda, parece apoiar essa medida ilógica. Por que motivo procede desta maneira? Que pressões estará sofrendo?

Vemos também políticos de esquerda batendo palmas. Certamente as armas das organizações de massa que eles controlam ou apóiam não devem estar cadastradas e não serão recolhidas! Enquanto isto, proprietários legítimos, que tiverem terras e casas invadidas, serão postos na cadeia se estiverem armados quando resistirem às turbas invasoras.

Pelo texto do Projeto de lei, as polícias, que não conseguem sequer manter o controle sobre seus presídios de segurança máxima, estarão encarregadas de recolher as nossas armas. Imaginem o que poderá acontecer...

A nossa última esperança é o Congresso Nacional. Rezemos para que lá prevaleça o bom senso da maioria.

Obs: o Autor é Coronel do Exército de Infantaria e Estado-Maior