Com armas, pelo desarmamento
Autoridades
e personalidades se manifestam contra o comércio de armas, mas não dispensam revólveres
e pistolas
Hugo Marques e Sérgio Pardellas
BRASÍLIA - O cidadão brasileiro que vai
decidir no domingo, dia 23, se deve ou não ser
proibido o comércio de armas tem razões
de sobra para ficar confuso. Caso se baseie nos registros
do Sistema Nacional de Armas (Sinarm), e nas declarações
de voto de políticos e outras personalidades,
encontrará uma vasta munição de
paradoxos e incoerências.
Há, por exemplo, os que vão votar ''Sim'',
(contra o comércio de armas) mas não dispensam
proteção armada em casa. É o caso
da apresentadora de TV Maria da Graça Meneguel,
a Xuxa, que tem registradas em seu nome uma pistola Smith
Wesson 380 e um revólver calibre 38, ambos com
o porte vencido. A artista não foi localizada.
O ex-ministro
das Comunicações, deputado
Eunício Oliveira (PMDB-CE), tem três armas
registradas em seu nome. Guarda em casa duas pistolas
calibre 380. Um revólver calibre 38 é dado
como roubado.
- Há 10 anos, tenho uma arma no Ceará e
outra na fazenda, em Goiás. Mas não uso.
Sou pelo desarmamento.
O
senador Demóstenes Torres (PFL-GO) assinou
a ata de fundação da Frente Brasil Sem
Armas. Isto não o impede de ter registrado um
revólver em seu nome, ''pendurado na parede, de
enfeite''. Alguém poderá pensar, então
que o senador vai votar ''Sim''. Engano:
-
Desarmar é importante, mas vou votar no ''Não'',
sem paixões - confessa o senador, parecendo não
se importar muito com a aparente confusão entre
gestos e decisões.
Dono de um
revólver calibre 38, o senador Juvêncio
da Fonseca (PDT-MS) considera importante garantir o direito à posse
de arma para ''preservar a integridade física
da família''. Mas não se mostra disposto
a dar explicações sobre o motivo pessoal
para ter uma arma:
- Não
interessa o motivo - dispara.
Há outras autoridades que não abrem mão
do seu arsenal pessoal, como é o caso do prefeito
de Goiânia, Iris Rezende (PMDB). Em 2002, ele tinha
14 armas registradas em seu nome. Na semana passada,
o número subiu para 15. O arsenal é formado
por revólveres e espingardas.
Algumas personalidades
se desfizeram dos arsenais particulares durante a campanha
do desarmamento, mas mantiveram parte
das armas. O governador do Distrito Federal, Joaquim
Roriz (PMDB), tinha 16 armas, entregou 13 à campanha,
mas ainda guarda um rifle, um revólver 38 e uma
pistola 380.
- Ele é fazendeiro
- tenta explicar o seu porta-voz.
Quando se
fala em arsenais, o ex-deputado Roberto Jefferson ganha
lugar de destaque. Embora tenha trocado o tiro
pelo canto lírico, o pivô do escândalo
do mensalão se esqueceu de vender as armas. Jefferson
tem registradas em seu nome 13 armas. São 9 revólveres,
duas espingardas calibre 12 e duas pistolas, incluindo
uma Ruger 44. Mais de um terço do dinheiro da
campanha do ex-presidente do PTB foi doação
das Forjas Taurus.
O equipamento
do deputado Abelardo Lupion (PFL-PR) também
impõe respeito: duas carabinas, duas pistolas,
um revólver e uma espingarda calibre 12, além
de um revólver calibre 38, dado como furtado.
Lupion também não foi encontrado pela reportagem.
O deputado Onyx Lorenzoni (PFL-RS) que o PT quer incorporar à tropa
de possíveis futuros cassados, é a favor
do ''Não'' e conta que - por carregar um revólver
- conseguiu atemorizar uma pessoa alcoolizada que o atacou.
Ao contrário, o ministro da Justiça, Márcio
Thomaz Bastos é ''Sim'' garantido. Ele teve um
revólver calibre 22 roubado há 11 anos,
no escritório, e não comprou mais arma,
com medo de acidente. Advogado criminalista e ministro,
Bastos teria justificativas de sobra para andar
armado. Tem segurança dia e noite da Polícia Federal
e preferência entre os ministros nos vôos
em aviões da FAB.
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