Objeções à Lei 10866 (Estatuto do Desarmamento)

O texto abaixo foi feito com o objetivo de subsidiar os advogados que pretendem entrar com ações de inconstitucionalidade contra a lei. A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) já iniciada pelo PTB não abrangeu todos os tópicos da lei aqui apresentados.

Considerações gerais:

A) Sempre fomos contra a criminalização do porte de arma ilegal porque ele parte do princípio de que quem está armado quer (ou vai) cometer algum crime. Acontece que o Estado Brasileiro, com poucas exceções, sempre restringiu a emissão de licenças de porte para seus cidadãos. Portanto, o cidadão que está ameaçado ou entende que corre algum risco, sempre se viu na constrangedora situação de ter de andar armado ilegalmente, igualando-se ao marginal. Portanto a suposição inicial da lei está errada, isto é: o cidadão honesto não pretende cometer qualquer crime, mas sim evitá-lo. Aboliu-se a presunção de inocência previsto na Constituição (Art. 5°, LVII)e instaurou-se a presunção de culpa.

É também muito estranho uma lei criada para punir "a intenção", mesmo se admitirmos que a intenção é verdadeira. Este princípio, levará nosso país a cair numa ditadura absolutista como nunca se viu nos tempos modernos.

Não podemos nos esquecer que o Porte de Arma é um crime de conduta, onde não há uma vítima real. Supõe-se que o indivíduo ilegalmente armado coloca em risco potencial toda a sociedade, o que não é verdade, já que os cidadãos honestos também estão andando armados ilegalmente por decisão arbitrária das autoridades. Pela primeira vez em nossa história crimes sem vítima levam à perda da liberdade (o porte e a mera posse de uma arma de fogo levam a perda da liberdade no corpo desta lei).

Estas são considerações que os juristas devem pensar a respeito. Que tipo de país nós queremos? Queremos liberdade ou apenas paz? A paz pode ser alcançada suprimindo-se o direito à defesa própria ou às liberdades individuais?

Esta lei divide a sociedade brasileira em 3 castas: a privilegiada, a civil comum e a civil comum rica, e ocorrendo o plebiscito previsto surgirá a quarta casta, a do civil comum pária. A casta privilegiada tudo pode. A do civil comum é considerada como idiota e incapaz de se defender ou é um bandido em potencial. A civil comum rica é a que pode pagar as altas taxas e os altos impostos que já incidem e incidirão sobre as armas. A civil comum paria é a que não tem nem poderá ter arma. Esta divisão da sociedade em castas é inconcebível e inconstitucional para um país que se diz democrático. Enquanto isto, aumenta a propaganda e as liberdades para o usuário de drogas, prostituição e pederastia, em total inversão dos valores tradicionais e o declínio da moralidade.

B) Optamos por não listar aqui o mérito da inconstitucionalidade por vício formal de iniciativa do projeto de lei do Senado, pois este assunto já foi muito bem abordado na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) movida pelo PTB (Mais um belo trabalho do advogado Wladimir Reale). Limitamo-nos às questões de mérito dos artigos, pois, como dito acima, muitos deles a ADIN acima referida não contemplou ou contemplou de forma apenas parcial.


Sobre a Lei 10866

A Lei em questão possui vários erros que podemos classificar em 3 grupos: Inconstitucionalidades, Ilegalidades e Incompatibilidades e simples Idiotices, tudo fruto da paranóia anti-armas de fogo (como se a arma de fogo em mãos de civis fosse a responsável pela "violência").


INCONSTITUCIONALIDADES:

São inconstitucionais os seguintes artigos:

Art. 2° inciso X

X - cadastrar a identificação do cano da arma, as características das impressões de raiamento e de microestriamento de projétil disparado, conforme marcação e testes obrigatoriamente realizados pelo fabricante;

As marcas produzidas pela arma nos projéteis mudam com o passar do tempo e o uso da arma. Não é como uma impressão digital ou como o DNA de uma pessoa que são imutáveis.
Cadastrar essas marcas não tem, portanto, qualquer utilidade para fins de esclarecimento de crimes. Isso foi muito bem explicado aos congressistas, inclusive pela ABCA. E o que dizer das espingardas, que possuem alma lisa e não deixam qualquer marca nos balotes? Este inciso foi aprovado apenas como forma de aumentar, ainda mais, o preço final das armas. Trata-se, portanto, de um imposto disfarçado sobre a produção, o que é inconstitucional.

Art.4º, inciso III com Art. 10 inciso II e § 2º

Art.4º Para adquirir arma de fogo de uso permitido o interessado deverá, além de declarar a efetiva necessidade, atender aos seguintes requisitos:...

III - comprovação de capacidade técnica e de aptidão psicológica para o manuseio de arma de fogo, atestadas na forma disposta no regulamento desta Lei.
Art. 10. A autorização para o porte de arma de fogo de uso permitido, em todo o território nacional, é de competência da Polícia Federal e somente será concedida após autorização do Sinarm.
§ 1o A autorização prevista neste artigo poderá ser concedida com eficácia temporária e territorial limitada, nos termos de atos regulamentares, e dependerá de o requerente:
II - atender às exigências previstas no art. 4o desta Lei;
§ 2o A autorização de porte de arma de fogo, prevista neste artigo, perderá automaticamente sua eficácia caso o portador dela seja detido ou abordado em estado de embriaguez ou sob efeito de substâncias químicas ou alucinógenas.

Os cidadãos que possuem Portes Funcionais, previstos em leis específicas, (juizes, promotores, procuradores, defensores públicos, procuradores da receita, deputados estaduais, deputados federais, senadores, secretários e sub-secretários de estado, chefes de gabinete do executivo, superintendentes de autarquias, superintendentes de fundações e de empresas públicas, ocupantes de cargos governamentais em comissão, auditores da fazenda nacional, fiscais do trabalho, fiscais do IBAMA, agentes da ABIN, guardas municipais, e agentes penitenciários, por exemplo) estão dispensados de atender os requisitos deste item III do Art. 4º e não são atingidos pelo § 2º do Art. 10, pois estas exigências não constam nas leis que autorizam seus portes. Isto cria uma casta de cidadãos privilegiados e intocáveis no país, basicamente os membros superiores dos três poderes. Um oficial da reserva das Forças armadas, por exemplo, preparado para defender o país não é contemplado, a não ser que faça parte da casta privilegiada. A lei deve ser igual para todos.

Art. 5º § 2º e Art. 11 inciso II

Art. 5º - O Certificado de Registro de Arma de Fogo, com validade em todo o território nacional, autoriza o seu proprietário a manter a arma de fogo exclusivamente no interior de sua residência ou domicílio, ou dependência desses, desde que seja ele o titular ou o responsável legal do estabelecimento ou empresa.

§ 2o Os requisitos de que tratam os incisos I, II e III do art. 4o deverão ser comprovados periodicamente, em período não inferior a 3 (três) anos, na conformidade do estabelecido no regulamento desta Lei, para a renovação do Certificado de Registro de Arma de Fogo.

Art. 11. Fica instituída a cobrança de taxas, nos valores constantes do Anexo desta Lei, pela prestação de serviços relativos:

II - à renovação de registro de arma de fogo;

Este parágrafo do Art. 5º, conjugado com o inciso II do Art. 11 cria um imposto disfarçado sobre a propriedade privada dos cidadãos comuns sem nenhuma contrapartida em serviços por parte do Estado. O Certificado de Registro é apenas um documento oficial que comprova a propriedade da arma, tal como o registro de um imóvel no cartório.

Art. 5º § 3º -

Art.5º § 3o Os registros de propriedade, expedidos pelos órgãos estaduais, realizados até a data da publicação desta Lei, deverão ser renovados mediante o pertinente registro federal no prazo máximo de 3 (três) anos.

Os registros de propriedade estaduais são atos jurídicos perfeitos e, portanto não precisam ser renovados. Caso o estado deseje passá-los para a esfera federal, isto deverá se dar sem ônus para o proprietário da arma. A propriedade particular não poderá ser confiscada caso o proprietário não renove o registro. Esta propriedade é reconhecida no próprio corpo desta Lei, no Art. 2º inciso I e outros.

Art.6º, Incisos I, II, III, V e VI
Art. 6o É proibido o porte de arma de fogo em todo o território nacional, salvo para os casos previstos em legislação própria e para:
I - os integrantes das Forças Armadas;
II - os integrantes de órgãos referidos nos incisos do caput do art. 144 da Constituição Federal; (Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, Polícia Civil, Polícia Militar e Bombeiros)
III - os integrantes das guardas municipais das capitais dos Estados e dos Municípios com mais de 500.000 (quinhentos mil) habitantes, nas condições estabelecidas no regulamento desta Lei;
V - os agentes operacionais da Agência Brasileira de Inteligência e os agentes do Departamento de Segurança do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República;
VI - os integrantes dos órgãos policiais referidos no art. 51, IV, (polícia da Câmara dos Deputados) e no art. 52, XIII, da Constituição Federal (polícia do Senado);
Se o Porte de Arma é proibido para todos os cidadãos, então os "casos previstos em legislação própria" (portes funcionais), assim como os casos previstos nos incisos I, II e III V e VI devem ser limitados ao horário de serviço, pois do contrário estaremos criando uma casta especial de privilegiados - é a desigualdade institucionalizada. Principalmente quando combinado com o Art. 10 § 2º.

Art.6º § 4º
§ 4o Os integrantes das Forças Armadas, das polícias federais e estaduais e do Distrito Federal, bem como os militares dos Estados e do Distrito Federal, ao exercerem o direito descrito no art. 4o, ficam dispensados do cumprimento do disposto nos incisos I, II e III do mesmo artigo, na forma do regulamento desta Lei.
Porque os oficiais da reserva ou policiais aposentados precisam cumprir o inciso III do Art. 4º (comprovar aptidão técnica e psicológica) e os da ativa não? Será que perdem a aptidão técnica, ficam irresponsáveis ou tornam-se psicopatas?

Art. 10
Art. 10. A autorização para o porte de arma de fogo de uso permitido, em todo o território nacional, é de competência da Polícia Federal e somente será concedida após autorização do Sinarm.
Ao limitar a competência de conceder portes de arma à PF, o legislador feriu o princípio federativo, pois os Estados têm competência para fazer suas próprias políticas de segurança publica.

Art. 11 § 2°

Art. 11. Fica instituída a cobrança de taxas, nos valores constantes do Anexo desta Lei, pela prestação de serviços relativos:
§ 2o As taxas previstas neste artigo serão isentas para os proprietários de que trata o § 5o do art. 6o e para os integrantes dos incisos I, II, III, IV, V, VI e VII do art. 6o, nos limites do regulamento desta Lei.
Mais uma discriminação. Porque os agentes da segurança do presidente, os integrantes das FA's, todas as categorias de policiais e bombeiros, os guardas municipais, os agentes da ABIN, os seguranças da câmara e do senado e os guardas prisionais não precisam pagar taxas para adquirir e manter suas armas particulares? Serão eles de uma casta privilegiada de cidadãos?

Art. 12 e Art. 16
Posse irregular de arma de fogo de uso permitido e proibido
Art. 12. Possuir ou manter sob sua guarda arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido, em desacordo com determinação legal ou regulamentar, no interior de sua residência ou dependência desta, ou, ainda no seu local de trabalho, desde que seja o titular ou o responsável legal do estabelecimento ou empresa:
Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.
Art. 16. Possuir, deter, portar, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob sua guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou munição de uso proibido ou restrito, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar:
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.
A Art. 12 é todo inconstitucional. A posse da arma não é crime, mas a ausência do registro sim. O cidadão será punido com a pena de detenção apenas por não possuir um documento em casa (o registro da arma). Nunca um documento oficial teve tanta importância. O registro de arma passa a ser mais importante que o registro de propriedade de imóveis e a carteira de identidade.
Como se não bastasse isso, o legislador cometeu evidente exagero inconstitucional ao considerar crime a simples posse de munição ou algum acessório de arma em casa. Milhões de pessoas possuem algum cartucho em casa, até como objeto de decoração ou como mera curiosidade. Munição sem a arma serve para absolutamente nada. O mesmo pode ser dito sobre acessórios. Uma baioneta, por exemplo, é um acessório de arma de uso restrito mas não passa de uma faca como outra qualquer. A posse de uma baioneta resultará em pena de 3 a 6 anos de reclusão. Trata-se de uma afronta ao princípio da razoabilidade e proporcionalidade como tantos outros que permeiam o corpo desta lei.
Além disso, o cidadão está sendo punido por uma "suposição de intenção criminosa", dado que não se pode alegar que a arma sem registro dentro da residência diminui o fator de segurança da sociedade mais que a arma com registro.

Art. 14
Art. 14. Portar, deter, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar:
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.
Parágrafo único. O crime previsto neste artigo é inafiançável, salvo quando a arma de fogo estiver registrada em nome do agente.
O legislador considera o mero transporte de arma como sendo porte de arma e ainda o considera crime inafiançável. Uma arma transportada desmuniciada e embalada não pode ser comparada a uma outra municiada e levada junto ao corpo para uso imediato. É um exagero inconstitucional. Não há no corpo da lei um artigo prevendo o transporte de arma, o que acaba com o direito de ir e vir e portanto mudar de local de residência ou de trabalho.
Da mesma forma, considera o transporte de acessório ou munição, itens inofensivos sem a arma, como se fosse um porte de arma. Outro exagero absurdo.
Como acessórios e munições não possuem registro, o cidadão não terá nem mesmo o benefício da fiança previsto para as armas registradas no parágrafo único.

Art. 15
Disparo de arma de fogo
Art. 15. Disparar arma de fogo ou acionar munição em lugar habitado ou em suas adjacências, em via pública ou em direção a ela, desde que essa conduta não tenha como finalidade a prática de outro crime:
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.
Parágrafo único. O crime previsto neste artigo é inafiançável.
O legislador considerou qualquer tipo de disparo de arma de fogo como sendo crime e não admite a existência de disparo que não seja para perpetrar um crime.
Ora, em casos de legítima defesa, é muito comum disparar-se um tiro para o alto ou para o chão como sinal de advertência. O legislador não previu a existência da legítima defesa. Qualquer disparo, seja defensivo ou não, tornou-se um crime inafiançável. A residência é um lugar habitado, portanto não poderá ser defendida.

Art. 16 inciso VI

VI - produzir, recarregar ou reciclar, sem autorização legal, ou adulterar, de qualquer forma, munição ou explosivo.

Pena - reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa.

Até a poucos anos atrás a recarga de cartuchos de espingarda era livre no Brasil, sendo seus componentes vendidos livremente no comércio especializado. Milhares de pessoas recarregam seus cartuchos para consumo próprio e não são criminosos. Da mesma forma, um atirador que se equipou para fazer recarga de munição não passa a ser um criminoso depois que cancela seu registro no Exército ou abandona o esporte.
Trata-se de um evidente exagero. Bastaria ao legislador criminalizar o comércio de munição recarregada para obter o efeito desejado.

Art. 21
Art. 21. Os crimes previstos nos arts. 16, 17 e 18 são insuscetíveis de liberdade provisória.
A liberdade provisória é garantia constitucional - parte do princípio de presunção de inocência. Portanto não pode ser vedado por lei, em caráter genérico, pelo legislador que está invertendo para presunção de culpa. Até o acusado do maior crime, o assassinato (usando qualquer meio, faca - por exemplo) pode ter liberdade provisória. Nos Art. 16, 17 e 18, sequer houve crime que a sociedade considera como tal (roubo, lesão corporal, assassinato, etc.).

Art. 23 § 3°
§ 3o As armas de fogo fabricadas a partir de 1 (um) ano da data de publicação desta Lei conterão dispositivo intrínseco de segurança e de identificação, gravado no corpo da arma, definido pelo regulamento desta Lei, exclusive para os órgãos previstos no art. 6o.
Devemos observar que este dispositivo intrínseco de segurança não é uma simples trava do cão tal com existe hoje nas pistolas. É um dispositivo mais complexo que ainda deverá ser objeto de regulamentação.
Este artigo cria mais uma discriminação entre os brasileiros: Só o Estado e seus representantes poderão ter armas eficazes. Os demais cidadãos só poderão ter armas que, para funcionarem, necessitarão da liberação de uma trava com a inserção de uma chave ou outro dispositivo qualquer. Estas armas serão consideradas de uso permitido enquanto que as outras, mais eficazes, serão classificadas como de uso restrito. O cidadão que desabilitar esta trava será condenado por alterar as características originais da arma (ver Art. 16 inciso II ).
Este parágrafo pede a identificação gravada no corpo da arma a partir de um ano após a publicação desta lei. Será que durante este ano as armas não precisarão ter número de série?

Art. 25 Parágrafo único
Art. 25. Armas de fogo, acessórios ou munições apreendidos serão, após elaboração do laudo pericial e sua juntada aos autos, encaminhados pelo juiz competente, quando não mais interessarem à persecução penal, ao Comando do Exército, para destruição, no prazo máximo de 48 (quarenta e oito) horas.
Parágrafo único. As armas de fogo apreendidas ou encontradas e que não constituam prova em inquérito policial ou criminal deverão ser encaminhadas, no mesmo prazo, sob pena de responsabilidade, pela autoridade competente para destruição, vedada a cessão para qualquer pessoa ou instituição
Este artigo é uma afronta à propriedade privada e à Constituição. Se o cidadão tem uma arma apreendida, ela será destruída mesmo se ele for inocentado das acusações. Quem indenizará os inocentes pela destruição de sua propriedade? Observar que, no parágrafo único, está bem claro que a arma não precisa estar arrolada como prova no inquérito. Isto significa destruição da arma mesmo quando o motivo do processo nada tenha a ver com o uso da arma ou sequer violência. É a violência e a arrogância do estado contra o cidadão. Não há qualquer consideração, inclusive, se a arma é de interesse histórico e/ou artístico, devendo por isso ser preservada.

Art 28

Art. 28. É vedado ao menor de 25 (vinte e cinco) anos adquirir arma de fogo, ressalvados os integrantes das entidades constantes dos incisos I, II e III do art. 6o desta Lei.

Mais um artigo discriminatório. Não apenas os integrantes das entidades constantes dos incisos I, II e III do Art. 6° desta lei, mas também todas as categorias possuidoras de porte de arma funcional estão dispensados de atendê-lo. Lembramos que 21 anos é a idade mínima para o cidadão se eleger deputado federal, estadual ou prefeito - categorias que podem portar armas. Outras categorias funcionais nem possuem qualquer restrição de idade. Além disso, a maioridade penal está definida na Constituição como sendo 18 anos (Art. 228).

Art. 29 com Parágrafo único
Art. 29. As autorizações de porte de armas de fogo já concedidas expirar-se-ão 90 (noventa) dias após a publicação desta Lei.
Parágrafo único. O detentor de autorização com prazo de validade superior a 90 (noventa) dias poderá renová-la, perante a Polícia Federal, nas condições dos arts. 4o, 6o e 10 desta Lei, no prazo de 90 (noventa) dias após sua publicação, sem ônus para o requerente.
Os portes de arma já concedidos são atos jurídicos perfeitos e não podem ser revogados. Os cidadãos que os obtiveram já tiveram que provar necessidade e outras exigências constantes na Lei 9437 ora revogada.

Art. 33 inciso II

Art. 33. Será aplicada multa de R$ 100.000,00 (cem mil reais) a R$ 300.000,00 (trezentos mil reais), conforme especificar o regulamento desta Lei:

II - à empresa de produção ou comércio de armamentos que realize publicidade para venda, estimulando o uso indiscriminado de armas de fogo, exceto nas publicações especializadas.

Este artigo é inconstitucional por cercear o direito de opinião. Ao mesmo tempo que a lei estabelece um plebiscito para referendar a proibição total do comércio de armas e munições no país, proíbe as empresas interessadas em divulgar os benefícios de possuir ou portar uma arma e assim esclarecer a população. Como é possível contestar as mentiras dos anti-armas sem incorrer no crime de "estimular" o uso de armas de fogo? Uma verdadeira ditadura de fato. Da forma como está redigido, o texto dá margem a que qualquer pessoa física ou entidade, que nada tenha a ver com a produção ou comércio de armas, não possa expressar sua opinião sobre o assunto.

Art. 35 § 1°
Art. 35. É proibida a comercialização de arma de fogo e munição em todo o território nacional, salvo para as entidades previstas no art. 6o desta Lei.
§ 1o Este dispositivo, para entrar em vigor, dependerá de aprovação mediante referendo popular, a ser realizado em outubro de 2005.
Este artigo contém diversas inconstitucionalidades. Em primeiro lugar não compete ao Congresso propor um referendo, apenas aprová-lo.
Além disso, se a proibição for aprovada no referendo, a casta dos cidadãos comuns será dividida em duas: os que têm armas e seus herdeiros e aqueles parias que não poderão jamais tê-las.
Os proprietários de armas também não poderão vendê-las para terceiros, pois ninguém mais poderá comprá-las, o que fere o direito de propriedade. Lembramos que na Austrália e na Inglaterra, onde foram impostas restrições a alguns tipos de armas, o governo recolheu as armas e indenizou todos os proprietários das armas recolhidas. Aqui os legisladores querem fazer a proibição total e sem incorrer em gastos.
Da mesma forma, sem indenização, provocará o desarmamento real mesmo daqueles que possuem armas legalmente, pois acabará com a venda de munição para armas de fogo. Finalmente, isenta de obediência a esta proibição os privilegiados do Art. 6° e os que possuem portes de arma funcionais, que continuarão podendo adquirir armas particulares e suas munições.


ILEGALIDADES & INCOMPATIBILIDADES:

Art. 2º itens VIII e IX conflitam com o Art. 24

Art. 2o Ao Sinarm compete:
VIII - cadastrar os armeiros em atividade no País, bem como conceder licença para exercer a atividade;
IX - cadastrar mediante registro os produtores, atacadistas, varejistas, exportadores e importadores autorizados de armas de fogo, acessórios e munições;
Art. 24. Excetuadas as atribuições a que se refere o art. 2º desta Lei, compete ao Comando do Exército autorizar e fiscalizar a produção, exportação, importação, desembaraço alfandegário e o comércio de armas de fogo e demais produtos controlados, inclusive o registro e o porte de trânsito de arma de fogo de colecionadores, atiradores e caçadores.

Justificativa: Está havendo superposição de atribuições. O Art 2º item VIII diz que compete ao SINARM conceder licença para exercer a atividade dos armeiros; o item IX diz que compete ao SINARM cadastrar os produtores, atacadistas e varejistas, exportadores e importadores de armas de fogo e o Art. 24 atribui ao Comando do Exército a competência de autorizar e fiscalizar a produção, exportação, importação de armas e o comércio de armas de fogo no país. Afinal, quem será o responsável por essas atividades? O mais provável, conhecendo-se o Brasil, é que ninguém se sinta responsável por alguma coisa.

Art. 5º - Está incompleto

Art. 5º O Certificado de Registro de Arma de Fogo, com validade em todo o território nacional, autoriza o seu proprietário a manter a arma de fogo exclusivamente no interior de sua residência ou domicílio, ou dependência desses, desde que seja ele o titular ou o responsável legal do estabelecimento ou empresa.

O legislador quis dizer que o cidadão também poderia ter arma no local de trabalho, mas esqueceu de escrever isto no artigo. Tal como está redigido não é possível possuir armas no local de trabalho. Também quem mora em imóvel alugado não poderá ter arma em casa, pois inquilino não é titular ou responsável legal do estabelecimento.

Art. 6º inciso IX e Art. 8º
Art. 6o É proibido o porte de arma de fogo em todo o território nacional, salvo para os casos previstos em legislação própria e para:
IX - para os integrantes das entidades de desporto legalmente constituídas, cujas atividades esportivas demandem o uso de armas de fogo, na forma do regulamento desta Lei, observando-se, no que couber, a legislação ambiental.

Art. 8o As armas de fogo utilizadas em entidades desportivas legalmente constituídas devem obedecer às condições de uso e de armazenagem estabelecidas pelo órgão competente, respondendo o possuidor ou o autorizado a portar a arma pela sua guarda na forma do regulamento desta Lei.

No Art. 6 inciso IX, o legislador quis se referir aos caçadores, mas portes de arma não se aplicam a armas longas. Entende-se como porte de arma o porte oculto de arma curta para defesa pessoal.
Ao se referir a entidades de desporto legalmente constituídas, a Lei autorizou o Porte de Arma para todos os atiradores e caçadores registrados, o que é confirmado no Art. 8º.
O legislador omitiu da Lei qualquer referência a transporte de arma. Fez isto com o objetivo de considerar o transporte de arma não autorizado igual ao porte de arma e assim ampliar o universo de pessoas puníveis (ver caput do Art. 14). Com isso criou uma confusão legislativa que a regulamentação não poderá sanar. O caso acima é apenas o primeiro exemplo: atiradores e caçadores não portam armas - apenas transportam de suas residências ao local da prática desportiva e retornam. Os colecionadores também transportam suas armas quando as adquirem, levam-nas para restauração ou para exposição e retornam com elas ao local de guarda.

Art. 6º § 1º - apropriação do patrimônio público
Art. 6o É proibido o porte de arma de fogo em todo o território nacional, salvo para os casos previstos em legislação própria e para:
§ 1o As pessoas previstas nos incisos I, II, III, V e VI deste artigo terão direito de portar arma de fogo fornecida pela respectiva corporação ou instituição, mesmo fora de serviço, na forma do regulamento, aplicando-se nos casos de armas de fogo de propriedade particular os dispositivos do regulamento desta Lei.

Este parágrafo autoriza estes cidadãos privilegiados a terem mais um privilégio, o de usar o patrimônio público (armas da corporação ou instituição) em proveito próprio, o que é ilegal. O correto é estas pessoas portarem apenas suas armas particulares após ou fora do expediente.

Art. 6º § 5º - Conflita com a proibição da caça
Art. 6o É proibido o porte de arma de fogo em todo o território nacional, salvo para os casos previstos em legislação própria e para:
§ 5o Aos residentes em áreas rurais, que comprovem depender do emprego de arma de fogo para prover sua subsistência alimentar familiar, será autorizado, na forma prevista no regulamento desta Lei, o porte de arma de fogo na categoria "caçador".

A caça é proibida em todo território nacional exceto no Rio Grande do Sul onde é permitida apenas a caça desportiva. Liberar a caça de subsistência sem controle será uma temeridade para nossa fauna. Além disso, compete ao Exército (Art. 24) registrar os caçadores existentes no Brasil e o Exército não registra aqueles que caçam com armas obsoletas (armas de antecarga, por exemplo), simplesmente por ser uma tarefa impossível.

Art. 9º conflita com Art. 10
Art. 9o Compete ao Ministério da Justiça a autorização do porte de arma para os responsáveis pela segurança de cidadãos estrangeiros em visita ou sediados no Brasil e, ao Comando do Exército, nos termos do regulamento desta Lei, o registro e a concessão de porte de trânsito de arma de fogo para colecionadores, atiradores e caçadores e de representantes estrangeiros em competição internacional oficial de tiro realizada no território nacional.
Art. 10. A autorização para o porte de arma de fogo de uso permitido, em todo o território nacional, é de competência da Polícia Federal e somente será concedida após autorização do Sinarm.
Pelo que está escrito acima, o Comando do Exército não pode dar porte de arma para arma de uso permitido. Ou seja, atiradores, colecionadores e caçadores só poderão portar armas de uso restrito. É mais uma confusão criada por não se prever o transporte de arma no país.
Porte de trânsito é o porte de arma de alguém que está levando outras armas para proteção das mesmas.Este porte é de arma de uso restrito, pois a de uso permitido só a PF poderá conceder.
Não está previsto em nenhum local desta lei a concessão de Guias de Tráfego por algum órgão. Assim, apenas como exemplo, o cidadão não está autorizado a levar para casa a arma que adquiriu na loja ou de levar sua arma para outra casa quando mudar de domicílio.

Art. 12 conflita com o Art. 14
Posse irregular de arma de fogo de uso permitido
Art. 12. Possuir ou manter sob sua guarda arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido ...
Porte ilegal de arma de fogo de uso permitido
Art. 14. Portar, deter, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob guarda ou ocultar arma de fogo

Como pode ser visto acima, o Art. 12 fala em manter sob sua guarda e o Art. 14 também fala em manter sob sua guarda, além de ter em depósito e ocultar. Só que as penalidades para estes sinônimos mudam, conforme o artigo, de detenção de 1 a 3 anos para reclusão de 2 a 4 anos. Pior ainda, se o crime for classificado no Art. 14 ele passa a ser inafiançável. Vai depender da idiossincrasia do juiz em relação ao réu.

Art. 27 está incompleto.
Art. 27. Caberá ao Comando do Exército autorizar, excepcionalmente, a aquisição de armas de fogo de uso restrito.

Quem autorizará a aquisição de armas de uso permitido aos colecionadores, atiradores e caçadores?

IDIOTICES e PARANÓIAS

Art. 6º Inciso I
Art. 6o É proibido o porte de arma de fogo em todo o território nacional, salvo para os casos previstos em legislação própria e para:
I - os integrantes das Forças Armadas

O legislador não definiu o que é integrante das FA's e tampouco menciona regulamentação própria. Portanto, todos os soldados e reservistas poderão portar armas.

Art. 16 inciso V
V - vender, entregar ou fornecer, ainda que gratuitamente, arma de fogo, acessório, munição ou explosivo a criança ou adolescente; e
Pena - reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa.

Faltou, neste inciso, a ressalva: "...salvo em local apropriado para a prática desportiva". Da forma como está, qualquer pai que emprestar uma arma ao filho num clube de tiro ou local de caça estará cometendo um crime.

Art. 23 § 1° e 2°
§ 1o Todas as munições comercializadas no País deverão estar acondicionadas em embalagens com sistema de código de barras, gravado na caixa, visando possibilitar a identificação do fabricante e do adquirente, entre outras informações definidas pelo regulamento desta Lei.
Evidentemente o legislador não conhece as normas internacionais para código de barras. Os códigos de barras apenas contém a descrição do produto e o fabricante. Será impossível, desta forma, o fabricante incluir o nome do adquirente na embalagem. Também não está claro se o adquirente é o lojista ou o usuário. Afinal, para que servirá identificar o lojista?

§ 2o Para os órgãos referidos no art. 6o, somente serão expedidas autorizações de compra de munição com identificação do lote e do adquirente no culote dos projéteis, na forma do regulamento desta Lei.

O legislador quis dizer na "base dos estojos" (nem todo estojo tem culote e nenhum projétil tem culote). Tal como está escrito, os fabricantes terão de inscrever estes dados na base de chumbo dos projéteis, o que é completamente impraticável e uma idiotice completa.

Art. 25 e Art. 32 parágrafo único
Art. 25. Armas de fogo, acessórios ou munições apreendidos serão, após elaboração do laudo pericial e sua juntada aos autos, encaminhados pelo juiz competente, quando não mais interessarem à persecução penal, ao Comando do Exército, para destruição, no prazo máximo de 48 (quarenta e oito) horas.
Parágrafo único. As armas de fogo apreendidas ou encontradas e que não constituam prova em inquérito policial ou criminal deverão ser encaminhadas, no mesmo prazo, sob pena de responsabilidade, pela autoridade competente para destruição, vedada a cessão para qualquer pessoa ou instituição
Art. 32. Os possuidores e proprietários de armas de fogo não registradas poderão, no prazo de 180 (cento e oitenta) dias após a publicação desta Lei, entregá-las à Polícia Federal, mediante recibo e, presumindo-se a boa-fé, poderão ser indenizados, nos termos do regulamento desta Lei.
Parágrafo único. Na hipótese prevista neste artigo e no art. 31, as armas recebidas constarão de cadastro específico e, após a elaboração de laudo pericial, serão encaminhadas, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, ao Comando do Exército para destruição, sendo vedada sua utilização ou reaproveitamento para qualquer fim.
O Art. 25, além de ser inconstitucional, é uma aberração econômica. Como todos sabem, as polícias de diversos estados brasileiros equipam-se com armamento apreendido de marginais que, muitas vezes, são superiores ao armamento padrão da corporação. A partir de agora isto não mais poderá ser feito. Parece até que o Brasil é um país rico. O motivo alegado é que o armamento apreendido pode retornar às mãos da marginalidade. Ora, se o armamento apreendido entrou na carga do órgão policial, a probabilidade dele ser desviado para a marginalidade é exatamente igual a do resto do armamento regular da corporação.

Art. 30
Art. 30. Os possuidores e proprietários de armas de fogo não registradas deverão, sob pena de responsabilidade penal, no prazo de 180 (cento e oitenta) dias após a publicação desta Lei, solicitar o seu registro apresentando nota fiscal de compra ou a comprovação da origem lícita da posse, pelos meios de prova em direito admitidos.

Quem tem nota fiscal da compra da arma já tem o registro - portanto o texto é inócuo. Que será a comprovação da origem lícita da arma?


Art. 34
Art. 34. Os promotores de eventos em locais fechados, com aglomeração superior a 1000 (um mil) pessoas, adotarão, sob pena de responsabilidade, as providências necessárias para evitar o ingresso de pessoas armadas, ressalvados os eventos garantidos pelo inciso VI do art. 5o da Constituição Federal. (eventos de igrejas e cultos religiosos)
Como se vê, a bancada do púlpito trabalhou bem neste artigo. Ficaram isentos de ter de adquirir dispendioso equipamento de detecção de metais e de constranger os fiéis.

Rio de Janeiro, 12 de fevereiro de 2004

Walter C. Merling Jr.
Presidente da ABCA
Museólogo especializado em Material Bélico

Leonardo Arruda
Diretor de Divulgação e Marketing da ANPCA