São contrárias ao fim de
utilidade as leis que proíbem o porte de armas
Título: Dos delitos e das penas
Autor: Cesare Beccaria
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§ XXXVIII
DE ALGUMAS FONTES GERAIS DE ERROS E DE INJUSTIÇAS
NA LEGISLAÇÃO
E, antes de tudo, das falsas idéias de utilidade
As falsas idéias feitas pelos legisladores a
respeito de utilidade são uma das fontes mais
abundantes de erros e de injustiças.
Ter idéias falsas de utilidade é ocupar-se
mais com inconvenientes particulares do que com os gerais;
desejar comprimir os sentimentos naturais em vez de procurar
excitá-los; fazer silenciar a razão e dizer
ao pensamento: “Sê escravo”.
Ter ainda idéias falsas de utilidade é sacrificar
mil vantagens verdadeiras ao receio de uma desvantagem
suposta ou pouco importante.
Não teria por certo idéias justas aquele
que pretendesse tirar aos homens o fogo e a água,
pois esses dois elementos, provocam incêndios e
inundações, a quem apenas soubesse obstar
pela destruição.
Podem do mesmo modo ser tidas como contrárias
ao fim de utilidade as leis que proíbem o porte
de armas, porque apenas desarmam o cidadão pacífico,
enquanto que deixam a arma nas mãos do criminoso,
muito habituado a violar as convenções
mais sacras para respeitar aquelas que são somente
arbitrárias.
Além do mais, tais convenções são
de pouca importância; pouco perigo existe em infringi-las
e, por outro lado, se as leis que desarmam fossem rigorosamente
executadas, destruiriam a liberdade pessoal, tão
necessária ao homem, tão respeitável
aos olhos do legislador esclarecido; submeteriam a inocência
a todas as perquirições, a todos os vexames
arbitrários que apenas devem ser reservados aos
celerados.
Essas leis apenas servem para aumentar os assassínios,
colocam o cidadão indefeso aos golpes do criminosos,
que fere mais audaciosamente um homem sem armas; favorecem
o bandido atacante, em desfavor do homem honesto que é atacado.
Tais leis são apenas o ruído das impressões
tumultuosas que acarretam alguns fatos particulares;
não podem ser o efeito de combinações
sábias que pesam numa só balança
os males e os bens; não é para prevenir
os crimes, porém pelo vil sentimento do receio,
que se fazem essas leis.
É por uma idéia falsa que de utilidade
que se procura submeter uma infinidade de seres sensíveis à singularidade
simétrica que pode receber matéria bruta
e sem vida; que se deixam de considerar as razões
presentes, únicas capazes de impressionar o espírito
humano de modo forte e durável, para utilizar
razões remotas, cuja impressão é fraca
e passageira, a não ser que uma grande força
de imaginação que apenas se encontra num
pequeno número de homens, supra o afastamento
do objeto, conservando-o sob relações que
o aumentam e o aproximam
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