
http://txt.estado.com.br
ESPAÇO ABERTO -
Segunda-feira, 17 de outubro de 2005
Vote
'não'!
Denis Lerrer Rosenfield
Vote não ao cerceamento das liberdades. A liberdade é um
pilar das sociedades democráticas, sem a qual
o autoritarismo viceja. Ela reside na opção
de escolha que tem cada indivíduo sobre o melhor
meio de conduzir a sua vida, observando regras construídas
em acordo implícito ou explícito com
outros indivíduos. Os acordos implícitos
são os que se dão pelos costumes e pelas
instituições e os explícitos,
os que se traduzem pela liberdade de expressão
e pela participação em eleições.
Em quaisquer dos casos, o domínio da vida privada
e da liberdade de escolha deve ficar ao abrigo de restrições
estatais. Quando o Estado procura impedir que o indivíduo
compre uma arma e seja pelo seu uso responsável,
ele se arroga uma posição de tipo claramente
autoritário, pois determina o que é o
bem para o cidadão, como se este fosse incapaz
de decidir e de escolher por si próprio, como
se fosse uma criança precisando de tutela. Amanhã,
se o sim vencer, o governo estará entrando em
outras esferas de sua vida, determinando como você deve
se conduzir.
Vote não à restrição dos
seus direitos. Direitos não são mercadorias
que podem ser simplesmente trocadas sem que haja uma
mudança de sua natureza. Os direitos formam
a estrutura de uma sociedade, a partir dos quais leis
são feitas em consonância ou não
com o desenvolvimento da liberdade. Se há consonância,
essa sociedade ampliará a esfera da atuação
individual, a cultura das pessoas, a liberdade de iniciativa
e uma formação social e política
capaz de dizer não à infração
de direitos fundamentais. Se não houver essa
consonância, a porta estará aberta para
que haja não apenas a não-observação
dos direitos, mas também a alteração
de leis que são o alicerce da liberdade de escolha.
Se o sim vencer, direitos fundamentais, como o da liberdade
de escolha, serão severamente restringidos,
deixando o cidadão à mercê de outras
violações estatais.
Vote não à ausência de segurança.
O mais surpreendente no atual referendo é que
nada é dito e menos ainda feito no que diz respeito
ao desarmamento dos bandidos. Foi inventado um factóide
de que estaríamos diante de um desarmamento
da população brasileira em geral. Ora,
não foi tomada rigorosamente nenhuma medida
pelo atual governo no que diz respeito à implementação
de uma verdadeira política de segurança
pública. Planos originais de começo de
mandato foram simplesmente abandonados e substituídos
por essa campanha que dará apenas maior liberdade
aos infratores da lei de agirem sem nenhuma restrição.
O que foi feito em relação às
polícias, à reforma do Código
Penal, aos serviços de inteligência, à reforma
e à ampliação das penitenciárias?
E o narcotráfico, essa fonte inesgotável
de violência e de uso e comércio clandestino
de armas? Nada! Agora, vende-se a falsa idéia
de que a violência diminuirá em nosso
país, pois os cidadãos de bem serão
desarmados! Os bandidos terão apenas maior liberdade
de ação, pois saberão que as casas
e os apartamentos estarão desprotegidos. A paz
será a dos bandidos, que agirão, então,
impunemente. Dizem as más línguas que
se estão formando comitês de meliantes
pelo sim. Estarão eles defendendo "legitimamente" os
seus interesses!
Vote não a um governo que vive abraçado
ao MST. Você ainda confia nesse governo? Tem
a sua palavra algum valor? No meio da maior corrupção
sistêmica da História republicana, vem
o presidente, na Folha de S.Paulo, publicar um artigo
em defesa do voto pelo sim. Ora, o mesmo presidente
Lula, semanas atrás, apareceu abraçado
a José Rainha, líder do MST, declarando
que este, sim, é um amigo para todas as horas,
desde antes das eleições e também
para depois do término do seu mandato. Um amigão,
enfim! Acrescentou, ainda, que ele estava sendo perseguido.
Esqueceu, no entanto, de dizer que ele não tinha
sido perseguido, mas preso pela Justiça por
posse ilegal de armas e formação de quadrilha.
Ou seja, o presidente Lula se abraça a um líder
revolucionário que age ao arrepio do Estado
de Direito, não respeita a democracia e usa
armas para a invasão de propriedades. Aí,
sim, o seu apoio é dado a quem usa armas, defendendo,
ao mesmo tempo, a tese de que os cidadãos de
bem sejam obrigados a se desarmar. Um pouco de coerência
não lhe faria mal. José Stédile,
sagaz, bem compreendeu a iniciativa governamental,
pois a apoiou imediatamente, tornando-se um dos mais
aguerridos defensores do sim. O MST poderá,
então, agir ainda mais sem travas, pois nem
medo terá de que os proprietários possam
estar armados para defenderem a sua integridade física,
os seus bens e a sua família. O voto do presidente
foi claro: diga sim ao MST! Diga, porém, não
a mais uma fraude eleitoral.
Vote não à hipocrisia de artistas que
usam e abusam da segurança privada. Os partidários
do sim têm usado e abusado de artistas que comparecem às
rádios e televisões defendendo a proibição
do comércio de armas. Deveria causar estranheza
uma tal participação, quando sabemos
que são pessoas de alto poder aquisitivo, que
vivem em condomínios fechados com segurança
24 horas. Seus deslocamentos são freqüentemente
feitos com o acompanhamento de seguranças privadas,
que poderão continuar comprando armas e munições.
Raramente um artista se encontra desprotegido. Ele
simplesmente não precisa assumir pessoalmente
a sua segurança, pois há pessoas contratadas
que cumprem essa função. A sua vida pessoal
não será minimamente atingida caso o
sim vença.
E aquelas
pessoas que não usufruem as mesmas
condições de vida e não contam
com a devida proteção do Estado? O que
farão elas, desarmadas, diante de meliantes
que entrarão sem nenhum obstáculo em
suas casas? E os habitantes de comunidades rurais,
distantes de qualquer proteção estatal?
Ligarão para quem? Para os que fazem uso da
hipocrisia?
Vote não à proibição,
afirme a sua liberdade!